O direitoso ABC.es, da Espanha, aprontou mais uma.
Na véspera da eleição presidencial de domingo, na Venezuela, apareceu uma história condenatória afirmando uma relação corrupta entre o candidato de esquerda, Nicolas Maduro e o ícone esportivo latino-americano Diego Maradona. O jornal espanhol de direita ABC publicou a história, que se espalhou como rastilho de pólvora por toda a internet, chegando a milhões de pessoas na Venezuela durante as eleições – que Maduro venceu por menos de 300 mil votos. O único problema é que a história era uma completa invenção e o ABC sabia.
O colunista do Open Democracy, Asa K Cusack, teve um estalo sobre como a história não batia, checou, e passou toda a véspera da eleição tentando derrubar a história falaciosa. Sem sucesso. Um trechinho da tenacidade do rapaz:
Pareceu-me estranho. Maradona é um esquerdista por convicção, ele tem uma tatuagem de Che Guevara em seu ombro direito, ele convive com Fidel Castro para se divertir; por que ele precisa ser pago para apoiar Maduro? Eu também sabia que esta história poderia fazer grandes danos. Os venezuelanos são loucos por aparelhos móveis e no dia anterior a uma eleição fundamental todos estariam ligados no Twitter, Facebook, e sites de notícias.
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Traçando a história do começo, eu achei que a ABC estava citando The Guardian como sua fonte, embora não tenha fornecido o link original. Pesquisando o The Guardian não havia nada, o que parecia impossível se a matéria realmente existiu.
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Tomando um novo rumo, em 8:50 eu decidi pedir esclarecimentos ABC via seção de comentários da própria história. Eu postei uma pergunta via Disqus (como usado pelo The Independent) pedindo a fonte original, e o comentário foi publicado no site. Na seguinte vez que chequei ele tinha sumido.
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Nesse meio tempo, mais da grande mídia tinha embarcado na história. O equivalente do Financial Times da Venezuela, El Mundo, tinha twitado isso (175.000 seguidores), assim como o NTN24 Latina (430 mil) e o proeminente defensor da oposição José Rafael Marquina (473000), entre muitos outros. O gênio saiu da garrafa.
Ah, a internet, esse telefone sem fio maldoso. A saga toda é bacana, vale ler o texto original.
Cusack conclui.
Não havia nenhuma razão para acreditar que a história tenha se baseado em fatos; as fontes eram inexistentes ou fracas, a premissa ilógica e os motivos para a propagação de uma história falsa, neste momento, são óbvios. No entanto, os meios de comunicação regionais a venderam inquestionavelmente ao redor do continente. A oposição venezuelana a consumiu e regurgitou com entusiasmo. Na política venezuelana, a verdade é muitas vezes imaterial; “dá-me uma mentira útil todos os dias!”
Assim como os comentaristas internacionais gostam de trompetear o papel das mídias sociais na Primavera Árabe, este relato mostra que elas podem ser abusados enormemente nos Estados onde a primavera está distante.