“Dá um like e compartilha” é um mantra vocalizado por aspirantes e pelos já estabelecidos influenciadores. Eles precisam convocar a audiência para que o processo de engajamento dos seus seguidores continue e seja ampliado. Há uma expectativa de que o trabalho de criação de conteúdo possa trazer dividendos, mesmo que de forma indireta, a partir da capacidade de aglutinar um público cada vez maior. Mas, para além dos bordões, quando neste circuito estão crianças cabe perguntar que lugar que elas ocupam nessa lógica que é, acima de tudo, capitalista.
Questionando a importância dos influenciadores-mirim para a circulação de capital e mercadorias e como se tornam mascotes do capitalismo em tempos de redes sociais, a artista plástica e pesquisadora Veridiana Zurita e o economista José Paulo Guedes Pinto publicaram um artigo na Eptic, importante revista acadêmica nacional sobre economia política da comunicação. Como descrito no trabalho intitulado “Influenciadores-mirins digitais e sua função na circulação do capital”, eles acompanharam alguns perfis no Instagram e canais no Youtube de crianças entre 7 a 10 anos, com milhares de seguidores, para compreender como acontece a dinâmica do trabalho – nesse caso, infantil – e, principalmente, a relação entre os influenciadores e seus seguidores.
O processo de monetização no Youtube – receber dinheiro por visualizações – foi iniciado em 2012. No Instagram, a forma de faturar é indireta, dependendo de publicações patrocinadas ou de vendas em loja controlada pelo influenciador. O interesse dos pesquisadores se deu sobre a performance dos influenciadores, assim como sobre o processo do trabalho para o engajamento dos seguidores. O influenciador-mirim é alguém que estaria respondendo à aceleração da circulação do capital na era informacional e, para isso, seria preciso, desde cedo, estabelecer método, tempo e resultados. “Ao performar, o influenciador anima cotidianamente o engajamento de seus seguidores que, por sua vez, produzem atenção traduzida em dados digitais”, escrevem.
O problema é concreto: há uma evidente exploração infantil capitalista na sua forma digital, mascarada como diversão ou uma simples atividade criativa. Não há uma regulação clara e o sistema de proteção legal, como o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), fica subsumido pelos termos de uso das plataformas.
Como já demonstrado por outras pesquisas com influenciadores brasileiros adultos, a auto-exposição online funciona como componente central da geração de valor, se tornando um ativo na economia digital que se baseia na capacidade dos indivíduos de cativar grandes públicos.
No influenciador, há um desejo de performance que se realiza na disponibilidade constante em estar em frente as câmeras produzindo (ou reproduzindo) algum conteúdo para seus seguidores – esse é seu trabalho. Para quem é criança, isso serviria como um processo de internalização de uma racionalidade sobre como acontece a circulação do capital. “Ele já não é mais somente um usuário, consumidor ou produtor (ou prosumer) mas peça intrínseca para o funcionamento de um sistema produtor de dados e engajamento responsáveis por acelerar a circulação do capital”, como concluem os pesquisadores.
Para ler o artigo: https://periodicos.ufs.br/eptic/article/view/19089
Esta nota faz parte do projeto “Inteligência Artificial e Capitalismo de Vigilância no Sul Global”, financiado pela Rede Latino-Americana de Estudos sobre Vigilância, Tecnologia e Sociedade e realizado pelo Labjor – Unicamp | Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo