foram hackers

por T. C. Soares em 22 de agosto de 2013, 2 comments

Esses caras querem hackear a internet.

A princípio, eles se parecem com qualquer outro bando de geeks. Mas então você percebe que um deles é Ward Cunningham, o homem que inventou o wiki, a tecnologia que sustenta a Wikipedia. E há Kevin Marks, ex-vice-presidente de serviços web da British Telecom. Ah, e reconheça Brad Fitzpatrick, criador do pioneiro site de blogs LiveJournal – e, mais recentemente, programador a trabalhar na sala de máquinas do império online Google.

Apertados numa pequena sala de conferências, esse variado bando de desenvolvedores de software tem um pedigree digital descomunal, e uma missão a cumprir. Eles esperam fazer o jailbreak da internet.

Eles chamam a coisa de movimento Indie Web, um esforço para criar uma rede que não é tão dependente de gigantes da tecnologia como o Facebook, o Twitter, e, sim, o Google – uma web que pertence não a um indivíduo, ou a uma empresa, mas a todos. “Eu não confio em mim mesmo”, diz Fitzpatrick. “E eu não confio em empresas.” O movimento surgiu de um projeto online igualitário lançado por Fitzpatrick antes de entrar no Google. Ao longo dos últimos anos, a proposta juntou cerca de cem outros programadores de todo o mundo.

O trecho acima é de uma matéria da Wired sobre o IndieWebCamp, encontro de pesquisadores e desenvolvedores envolvidos com o movimento Indie Web.

Basicamente, a ideia é oferecer um ecossistema online aberto que, em vez de substituir os espaços proprietários de socialização e tráfego de dados dominado por gigantes como Facebook e Google, dialogue com essas redes fechadas. Mais ou menos como abrir frestas nas paredes dos silos das redes sociais e dos serviços oferecidos por essas grandes empresas, permitindo que dados e informações fiquem não apenas na mão dessas companhias – e, sendo o caso, garantir que usuários e usuárias da internet tenham a opção de usar ferramentas de comunicação abertas, que possam guardar seus dados em servidores próprios ou comunitários.

Na verdade, ao que parece o movimento é ainda bem novo. Mas é possível que a coisa cresça. Eu, pelo menos, não me sinto tão bem com a ideia de minha vida online ser propriedade do Facebook, trancada na caixa-forte deles. E o fato de alguns governos andarem com a chave desse cofre no bolso não ajuda.

uma coisa é uma coisa

por T. C. Soares em 21 de agosto de 2013, 2 comments

Em 2009, Bradley Manning tinha 22 anos e era um soldado dos EUA estacionado em Bagdá. Como especialista em sistemas de inteligência, ele tinha acesso ao banco de dados usado pelo governo para a organização e transmissão de informações confidenciais.

Logo após ter acesso aos sistemas de segurança dos Estados Unidos, num movimento que deixará cientistas políticos e psicólogos e filósofos coçando a cabeça por muitos, vários anos, Manning sentiu que as informações de que cuidava deveriam ser mostradas às pessoas e contatou o pessoal do Wikileaks – então, uma nova e não muito conhecida iniciativa de mídia radical.

Para o Wikileaks, Manning repassou dados confidenciais sobre ataques de militares dos EUA a civis no Iraque e no Afeganistão, memorandos de diplomatas americanos sobre suas intervenções na política interna de outros países, relatórios sobre a sistematização de crueldades na prisão de Guantánamo. Hipóteses radicais e teorias de conspiração saíram de suas gavetas e foram tomar um pouco de sol, promovidas, enfim, a verdade das coisas.

No começo de 2010, Bradley Manning puxou papo na internet com Adrian Lamo. Hacker tornado consultor de segurança, Lamo é o que, no jargão da cibercultura, é conhecido como gray hat, o sujeito que vive na zona cinzenta entre o que, simplificadamente, seria o “hack ético” (white hat) e o “hack desonesto” (black hat). No bate-papo, Manning contou sobre as informações vazadas para o Wikileaks, e meio que imediatamente Lamo o denunciou a o FBI (apesar de ter garantido manter a informação em segredo). Lamo repassou, ainda, o registro do chat que teve com Manning para a Wired, que publicou parte da conversa e foi a primeiro veículo a dar a história.

Pouco tempo depois, em meados de 2010, Bradley Manning foi detido. E assim continuou, e assim continuará pelos próximos 35 anos, de acordo com a pena hoje recebida ao fim de seu julgamento – embora, segundo alguns especialistas, exista a possibilidade de que em oito anos ele venha a cumprir o resto da pena em liberdade condicional.

(A pena de Manning é três vezes maior que a sentença máxima dada aos soldados envolvidos na tortura de prisioneiros na prisão de Abu Ghraib. E a Anistia Internacional condenou seu sentenciamento.)

Há poucos meses, Edward Snowden, então um especialista em tecnologia de 29 anos contratado pela CIA, saiu de casa para nunca mais voltar, pegou um avião dos EUA para Hong Kong, e lá contou a jornalistas que somos espionados na internet o tempo todo pelo governo americano (e pelo Vale do Silício). Hoje exilado na Rússia, Snowden não pode mais voltar a seu país, onde o espera uma acusação de espionagem e uma pena de 30 anos a ser julgada. Tanto ele como Manning se embrenharam fundo no motor da guerra e da espionagem de seu país (que vem a ser o mais poderoso do mundo), e viram os cheat codes do maquinário do poder global, e encararam mais riscos do que as pessoas normalmente parecem dispostas a correr para mostrá-los pra todo mundo.

Li todo tipo de coisa tentando entender os motivos de Manning, hipóteses que passam por seu voluntarismo juvenil, pelo seu sentimento patriótico, pela sua negação do complexo industrial-militar, pela sua sexualidade (psicólogos que o acompanham afirmam que ele teria se descoberto transgênero, e viveria um delicado momento de instabilidade e reconstrução emocional). Talvez alguns desses motivos façam sentido, talvez seja tudo junto. Snowden se justificou dizendo que gostaria apenas “de informar o público sobre o que foi feito em seu nome, e sobre o que foi feito contra” – argumento que, em sua lógica cristalina, parece ter deixado os analistas igualmente desorientados.

Talvez a coisa tenha a ver com alguns absurdos às vezes se apresentarem como os absurdos que são, e algumas pessoas não conseguirem dar de ombros e deixar quieto.

***

Essas eram apenas uma ou duas coisas que eu queria falar sobre a condenação de Bradley Manning. Aqui, porém, tem algo mais pedaçudo a respeito do Wikileaks.

desliga o estabilizador quando for embora, por favor

por T. C. Soares em 19 de agosto de 2013, Comentários desativados em desliga o estabilizador quando for embora, por favor

Cientistas esqueceram o laboratório funcionando durante a folga e acabaram inventando o maior absorvente de água de todos os tempos.

Uma equipe de cientistas suecos conseguiu o impossível ao produzir por acaso a substância conhecida como Upsalite – depois de deixar seu equipamento em funcionamento no fim de semana.

O avanço tem aplicações comerciais de amplo alcance, dado que o Upsalite (assim batizado por conta da Universidade de Uppsala, onde os cientistas estão baseados) é o absorvente de água mais eficiente do mundo. Ele poderá ser usado na remoção de umidade no desenvolvimento de medicamentos e de eletrônicos de alta tecnologia, e na limpeza de grandes vazamentos de petróleo.

(…)

A ironia é que, embora a equipe de Uppsala há tempos tentasse criar o material impossível, eles o estavam fazendo pelo caminho errado.

“Na tarde de uma quinta-feira, em 2011, alteramos levemente os parâmetros de síntese utilizados em nossas tentativas frustradas, e por engano deixamos o material na câmara de reação durante o fim de semana. Ao voltarmos para o trabalho na segunda-feira de manhã, descobrimos que um gel rígido tinha se formado, e após secá-lo começamos a ficar animados “, diz (o cientista) Johan Gomez de la Torre.

Eu mesmo faço isso direto.

 

você gosta mais de: ( ) batata ( ) estudar

por T. C. Soares em 15 de agosto de 2013, Comentários desativados em você gosta mais de: ( ) batata ( ) estudar

Seus comentários nas redes sociais podem ser o futuro da pesquisa eleitoral.

Segundo pesquisadores da Universidade de Indiana, a ligação entre tweets e os votos nas eleições políticas pode ser mais forte do que se pensava. Em um estudo analisando 537 milhões de tweets de agosto de 2010 – a maior amostra de tweets tornada acessível a pesquisadores acadêmicos – o percentual de votos para os candidatos Democratas e Republicanos na Câmara dos Representantes (dos EUA) é parelha ao percentual de tweets em que são mencionados.

(…)

O estudo contribui para a crescente evidência de que as redes sociais não são, como se pensava, efêmeras fontes de informação infestadas de spam. Na verdade, o Twitter e o Facebook podem vir a ser o meio mais válido para se medir o eleitorado norte-americano, uma vez que os sentimentos nas mensagens de fato não faz muita diferença.

É verdade que nesse caso o exemplo dos EUA tem muitas assimetrias em relação ao Brasil, especialmente no que diz respeito à inclusão e ao letramento digital. E a diferença nos sistemas políticos também poderia vir a interferir nas métricas de análise de intenção de votos em redes sociais e tal. Mas é bem possível que com o tempo esse seja o cenário também por aqui, e é difícil deixar de pensar que na verdade estamos respondendo a pesquisas nas redes sociais o tempo todo – o segredo é só criar o formulário certo pra tabular o que já dizemos. Enfim, big data é isso.

sorria seus metadados são nossos

por T. C. Soares em 12 de agosto de 2013, Comentários desativados em sorria seus metadados são nossos

Ficou encanado/a com o programa de espionagem online do Obama? Anda com o pé atrás com o TSE depois daquela história da Justiça Eleitoral repassar os dados pessoais de todo mundo pro Serasa? Começou a apagar o histórico de navegação do computador a cada meia hora? Em colaboração pro OPlanoB, a Marta Kanashiro, que acompanha bem de perto esse debate, comenta a lógica de rastreamento e cruzamento total de dados nos ambientes digitais – e o quanto isso nos afeta nas pequenas coisas.

 

Os debates sobre dados pessoais e espionagem que estouraram com o caso NSA/Prism são uma grande oportunidade para publicizar inúmeras questões.

Dentre muitas, uma recente matéria do Libération nos obriga a questionar o que Obama quer dizer quando afirma que a espionagem não afeta (ou seja, “não se dirige a”) cidadãos comuns (e é um pouco preocupante se isso te deixou aliviado ou esperançoso). Afinal, essa afirmação está bem próxima da ideia de que “se você não deve, não teme”. Em época de tantas divisões e construções de perfis, talvez devêssemos ficar mais atentos e não cair no conto de que os EUA estariam encontrando um equilíbrio entre segurança e privacidade que não atinge “a gente”. Afinal, quem define se você é vândalo? Ou manifestante pacífico? Ou terrorista? Ou cidadão de bem? Ou aliado? E note que a palavra perfil (“profile”, em inglês), não à toa, não é substituível por “representação”, ou “identidade”. Daria até pra dizer que o termo foi escolhido para que nos obriguemos a entender como é possível, a partir da pura relação entre dados, estabelecer perfis.

A explicação (um apelo) do Obama foi a seguinte: “… quero, mais uma vez, ressaltar que a América não está interessada em espionar pessoas comuns. Nossos serviços de inteligência estão focados em encontrar a informação necessária para proteger o seu povo e, em muitos casos, para proteger seus aliados ” – E deixamos todos com a angustiante necessidade de pensar se você se considera comum, aliado e pacífico, e com a curiosa proposição de atividade: qual perfil poderia ser traçado de tudo o que você faz e troca na internet?

Enquanto isso, no universo brasileiro, a gente bem que poderia perceber a proximidade que existe entre o Prism e o recente acordo revelado entre TSE & Serasa.

Aliás, deveríamos ficar muito atentos ao debate – que já promete sumir de cena – em prol de “uma eleição muito moderna!” Sim, porque afinal já vieram se explicar, não? O dano já foi revertido (bem, é o que nos dizem, apaziguando a coisa): a presidenta do TSE anulou o acordo com a Serasa e também nos garantiu que nenhum dado foi transmitido. Ufa! Podemos esquecer o assunto e respirar aliviados. Podemos? Talvez o papo por lá tenha sido o seguinte: “Apaga rápido esse incêndio, antes que comecem a questionar a urna biométrica. Pelamor, as eleições estão aí. Como vocês deixam aparecer um negócio desses justo agora que a gente estava promovendo o recadastramento de eleitores e a urna biométrica! Vocês sabem o quanto gastamos para enfiar aquele monte de propagandas na TV para promover esse processo?”

Mas ok, somos muito imaginativos. Um papo desses jamais deve ter acontecido. Ainda assim, vale a pena ao menos desconfiar um pouco, levar em consideração que as coisas não estão todas resolvidas e apontam problemas bem mais sérios, relativos a tudo que valeria em seus dados, cidadão comum.

Para quem tem interesse em se aprofundar no assunto ou ainda não entendeu o quanto valem seus dados e tudo que gira em torno disso (algo que, na verdade, não é sobre os SEUS ou os MEUS dados, mas que tem a ver, no grande cenário, com a lógica “informação = valor”) vale a pena ler o artigo Metadata or Content: NSA is not the only data collector you should fear. Mesmo que não dê para concordar com o texto quando diz “que devemos temer os coletores de dados”, ele é interessante para percebermos a necessidade de nos informar e perceber que já estamos participando disso. A matéria fala, entre outros, dos jogos e aplicativos que rolam dentro do Facebook: listando alguns como os Farmville, os Criminals da vida etc. E chama a atenção: “Cada vez que você autorizar um aplicativo ou jogo usando uma conta de mídia social, tire um tempo para saber quais metadados ou conteúdos você está se comprometendo a compartilhar”.

Marta Kanashiro é professora da Unicamp e membro da Rede Latino-Americana de Estudos sobre Vigilância, Tecnologia e Sociedade (LAVITS)

botando ordem no bonde da vigilância

por Rafael Evangelista em 31 de julho de 2013, Comentários desativados em botando ordem no bonde da vigilância

No mesmo dia que o Guardian revela a existência do XKeystore – tipo um super Google da espionagem (sim, eu sei que tem redundância aí) – um grupo de entidades – coalizão, dizem eles, baita palavra massa – lança o que seriam os princípios fundamentais para proteger os direitos humanos dos ataques da vigilância.

Os direitos humanos são um princípio interessante para conseguir algum norte em termos de o que é básico para se proteger. A declaração universal dos direitos humanos é um documento que goza de unanimidade e prestígio internacionais. É a partir dela que essa coalização propões alguns princípios para colocar ordem na casa da vigilância. Diz o comunicado da EFF:

Eles [os princípios] incluem requisitos que a lei de vigilância garanta que todas as interceptações sejam legais, e por um fim legítimo, necessário, proporcional e adequado; ser supervisionada por uma autoridade judiciária competente; incluem a transparência, notificações de usuários, sob supervisão pública e devido processo legal, proteger a integridade dos sistemas de comunicação e incluir salvaguardas dos direitos humanos contra o acesso ilegítimo e uso indevido de procedimentos de cooperação entre os Estados.

A liberação dos princípios vem na esteira de um relatório do Relator Especial da ONU sobre o Direito à Liberdade de Opinião e Expressão, que detalha o uso generalizado de vigilância estatal de comunicação. O relatório afirma que tal vigilância mina severamente a capacidade dos cidadãos de desfrutar de uma vida privada, de expressarem-se livremente e de desfrutarem de seus outros direitos humanos fundamentais. Recentemente, o Comissário da ONU para os Direitos Humanos, Navi Pillay Nivay, enfatizou a importância da aplicação de normas de direitos humanos e as garantias democráticas para vigilância e atividades de aplicação da lei.

O documento foi o resultado de um ano de consulta da sociedade civil e especialistas em privacidade e tecnologia. Os princípios são co-assinados por mais de cem organizações de todo o mundo. Na liderança desse processo estiveram a EFF e a Privacy International.

olá guerra fria

por T. C. Soares em 31 de julho de 2013, 2 comments

Os EUA tem um avião que passa o ano todo voando ao redor de Cuba transmitindo programação de TV anticastrista. E Cuba passa o ano todo neutralizando o sinal.

Nos últimos seis anos, o governo dos EUA gastou mais de US$ 24 milhões para voar um avião em torno de Cuba e transmitir programação de TV patrocinada pelos americanos para os habitantes da ilha (nota: o canal é conhecido como Radio e TV Martí). Mas a cada dia que o avião voa, o governo de Havana congestiona seu sinal de transmissão. Poucos cubanos (se é que há algum), conseguem ver o que ele transmite.

O programa é executado pelo Broadcasting Board of Governors (BBG) dos EUA, que, nos últimos dois anos, pediu ao Congresso que acabasse com o programa. Como motivo, o órgão cita o seu gasto exorbitante e o duvidoso custo-benefício. “O sinal é fortemente embaralhado pelo governo cubano, limitando significativamente o alcance dessa plataforma e seu impacto sobre a ilha”, diz o pedido de orçamento para o ano fiscal administrativo de 2014.

(…)

Mas, independente do que acontecer, a programação da Rádio e TV Martí não acabará como um todo. O BBG está entusiasmado com a possibilidade de outros métodos para levar sua programação aos telespectadores e ouvintes cubanos: divulgação de DVDs, distribuição de pen drives, transmissão via satélite e até mesmo um possível novo aplicativo para smartphone. As várias soluções alternativas carregariam, todas, a programação da Martí.

Da Foreign Policy.

backdoor inside

por T. C. Soares em 31 de julho de 2013, 2 comments

Esses dias a gente falou da possibilidade de computadores fabricados nos EUA saírem de fábrica com o hardware já no jeito pra vazar informações pro governo. E olha só, um pessoal tem meio que a certeza que os chineses também andariam fazendo isso.

Baseada em Pequim, a fabricante de computadores Lenovo teria sido colocada por anos na lista negra de agências de espionagem de todo o mundo. A atitude relaciona-se à persistente preocupação com a possibilidade de hacking sancionado pelo governo chinês. De acordo com o Australian Financial Review, Austrália, Reino Unido, Canadá, Nova Zelândia e EUA teriam, desde meados da década de 2000, rejeitado máquinas da Lenovo para suas redes ultra-secretas – embora os computadores pudessem ser usados ​​para tarefas de menor segurança, que não envolvessem informações sensíveis. Fontes dizem que a agência de inteligência britânica encontrou “back-door” em hardware e vulnerabilidade no firmware de produtos Lenovo, levando-os a alertar que, dados os laços da empresa com o governo chinês, ela poderia representar uma ameaça à segurança.

Bom, pelo menos você pode escolher pra quem gostaria de vazar suas informações.

Via The Verge.

a privatização não perdoa nem os refugiados políticos

por Rafael Evangelista em 25 de julho de 2013, um comentário

Jimmy Mubenga era um refugiado político angolano que viveu no Reino Unido desde 1994, por 16 anos. Tinha uma esposa e cinco filhos, todos nascidos por lá e cidadãos britânicos. Até que ele se envolveu em uma briga de bar, foi condenado e sentenciado a deportação. O que se abriu então, segundo as palavras do Guardian, foi “uma história chocante de um sistema de deportação cruel, de racismo e desumanidade”.

Jimmy caiu nas mãos da G4S, a maior empresa privada de segurança do mundo. O relato é do CorpWatch:

Quando Mubenga foi levado ao vôo 77 da British Airways de Londres para Angola, foi tratado “pior do que um animal”, disse a esposa de Mubenga, Adrienne Makenda Kambana. Kevin Wallis, um engenheiro de petróleo que estava sentado na fila da frente, disse que viu os seguranças “segurando-o para baixo” e Mubenga estava “gemendo”.

Deportados muitas vezes são levados para fora do Reino Unido por empresas de segurança em vôos comerciais, sob a Lei de Imigração 1971. Outros são levados em voos especialmente fretados. No entanto, se os deportados lutarem, os pilotos costumam fazer desembarcar os agentes da empresa contratada. A fim de evitarem serem expulsos, guardas de segurança desenvolveram uma técnica chamada “karaokê de tapete”, que envolve empurrar para frente “um deportado que está sentado e com cinto de segurança afivelado”, fazendo com que ele “cante para o tapete” “e seus gritos e choros sejam abafados”. As aspas são de um relatório de 2011 intitulado “Out of Control” escrito pela Anistia Reino Unido.

Antes do vôo decolar, Mubenga parou de gemer e ficou em silêncio. Uma ambulância foi chamada e ele foi declarado morto.

 

O caso aconteceu em 2010, mas os três agentes da G4S foram condenados por assassinato recentemente.

O quê a privatização tem a ver com isso?, você pergunta.

O inquérito que resultou na condenação dos agentes descortinou a realidade maquiada das “indústria da remoção”, em que as deportações são um serviço lucrativo com contratos milionários. “A G4S era paga por hora e se a deportação falhasse o lucro iria pro ralo. A remuneração dos agentes era por hora trabalhada . Era importante fazer o serviço, incentivos financeiros eram dados se as remoções acontecessem com sucesso.” As aspas são do advogado da família de Mubenga.

A G4S não trabalha mais para o Reino Unido. Porém, em seu lugar, foi contratada a Tascor, uma subsidiária da Capita, que recontratou muitos dos agentes e supervisores da G4S.

A família de Mubenga está processando a G4S.

 

reparação

por T. C. Soares em 24 de julho de 2013, um comentário

Alan Turing foi um pai fundador da computação moderna. Sua pesquisa a respeito da tecnologia criptográfica nas décadas de 30 e 40 foi essencial no desenvolvimento de dispositivos de comunicação na Segunda Guerra, e é bem possível que sem seu esforço junto ao governo britânico para quebrar os sistemas criptográficos nazistas a Inglaterra não resistisse a Hitler. Após a guerra, seus estudos sobre o processamento de informação por máquinas foram centrais ao desenvolvimento da noção de inteligência artificial. Sua obra reformulou a ideia do que, enfim, computadores deveriam ser.

Em 1952, Turing foi condenado por ser homossexual – na época, a homossexualidade, associada pelas autoridades à noção de atentado ao pudor, era considerada crime na Inglaterra. Obrigado a escolher entre a cadeia e a castração química, ele preferiu a segunda. E se suicidou não muito tempo depois.

Até hoje o governo britânico não perdoou Turing oficialmente. Mas talvez isso mude, noticiou o The Telegraph.

Até o momento, o governo tem resistido a usar a Prerrogativa Real para perdoar Turing por sua condenação, em 1952, por atentado violento ao pudor pelo motivo de ser homossexual.

(…)

Durante anos, ativistas pediram aos ministros para que revertessem a decisão por causa do papel por ele desempenhado na vitória da Segunda Guerra após inventar, em Bletchley Park, a máquina Colossus para quebrar os códigos de submarinos alemães no Atlântico.

Apesar de seu trabalho, ele foi condenado por atentado violento ao pudor e escolheu como castigo a castração química em vez da prisão. Dois anos depois, cometeu suicídio, aos 41 anos.

Em dezembro passado, o professor Stephen Hawking e outros cientistas renomados escreveram ao The Daily Telegraph pedindo o perdão de Turing, cujo trabalho em Bletchley é considerado essencial para a abreviação da Segunda Guerra Mundial.

Falando na Câmara dos Lordes na sexta-feira, o chefe de bancada Lord Ahmad de Wimbledon disse que o governo não ficaria no caminho de um projeto de lei do Liberal Democrata Lord Sharkey, que oferece a Turing um perdão póstumo completo.


Vale lembrar que em 2009 o então primeiro-ministro, Gordon Brown, fez um pedido de desculpas póstumo – mas este não veio acompanhado do perdão oficial.

Atrasado e tudo, esse perdão é o único gesto possível, acho. Agora só falta oferecê-lo a todas as outras pessoas condenadas pelo mesmo motivo.