Pós-colonialismo crítico pode neutralizar armadilhas da era digital

por Fabricio Solagna em 23 de setembro de 2024, Comentários desativados em Pós-colonialismo crítico pode neutralizar armadilhas da era digital

Ao mesmo tempo que proporciona oportunidades de expressão e contato entre comunidades marginalizadas, a “era digital” aprofunda desigualdades e refaz estruturas de poder coloniais. Navegar por essas contradições requer fazer uso de um pós-colonialismo crítico, que “desafie legados coloniais, promova justiça social e crie uma sociedade global mais inclusiva e equânime”.

Se a “era digital” abriu inúmeras possibilidades, também preservou legados coloniais embutidos nas tecnologias desta época. A reflexão está no ensaio “Post-Colonialism And The Digital Age”, de Ghada Fayez Refaat Abu Enein, publicado no Journal of Namibian Studies. Doutora em Literatura Inglesa, a autora é ligada à Faculdade de Educação de Ciências e Artes da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Próximo Oriente (UNRWA) em Amã, na Jordânia, e tem uma longa bibliografia que aborda a questão colonial e os conflitos sobre gênero e imigração.

A partir de uma metodologia que mistura análise bibliográfica detida com um destrinchar do assunto em tópicos, Ghada Enein muitas vezes abre eixos que segundo ela mesma necessitam de melhor investigação, em mais profundidade. Um dos pontos altos do texto é examinar como várias das questões estão sendo incorporadas e compreendidas por autores fora do eixo da Europa-EUA. O artigo cita, por exemplo, o livro Cyberculture and the Subaltern, de 2014, editado por Radhika Gajjala, que traz vários casos da Africa e da India, sobre como realidades offline são moldadas por hierarquias online, em relatos etnográficos.

O ensaio estabelece dois enquadramentos de análise: pós-colonialismo digital; e liberação digital. Neles, desdobra desafios e oportunidades. Como, por exemplo, a “era digital” ser ao mesmo tempo espaço para o diálogo online de comunidades e identidades diaspóricas de resistência, enquanto também é espaço potencial para práticas neocoloniais, como o imperialismo digital e a dependência econômica. Sobre esta última ameaça, a autora ressalta o papel da “concentração de poder nas mãos dos gigantes tecnológicos globais”.

Ghada Enein reflete ainda sobre as limitações e a possível cooptação do ativismo digital. “Discussões sobre preservação cultural, representação e a ética da digitalização precisam se centrar nos direitos e na agência das comunidades pós-coloniais”, conclui, apontando para a ação realmente autônoma dos grupos políticos.

Para ler o artigo: https://namibian-studies.com/index.php/JNS/article/view/5370

Lavits


Esta nota faz parte do projeto “Inteligência Artificial e Capitalismo de Vigilância no Sul Global”, financiado pela Rede Latino-Americana de Estudos sobre Vigilância, Tecnologia e Sociedade e realizado pelo Labjor - Unicamp | Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo